domingo, 12 de abril de 2009

Acordes de Verão

Disse-te que uma dia voltaria, mas que agora teria de ir. Estavas desolada mas mesmo assim dei-te o meu melhor sorriso e gozei contigo por teres vestido a camisola do avesso. Não querias largar o meu pescoço. Mandei-te embora e pude então morrer. Não queria que me visses moribundo. Tronco de árvore à deriva na correnteza. Procurei-te por todo o lado. Na fotografia passe em que dizias que estavas bonita, no cheiro que restou de ti colada ao meu corpo, no cubo mágico em que apenas nos faltou fazer duas faces. Parece que ainda te consigo ouvir:"Vamos deixar o amarelo e o azul para o fim. São as nossas cores. Deixamos o fácil para o fim".
Já levava mais de seis horas de viagem quando o revisor chegou ao pé de mim. Demorei imenso tempo a encontrar o bilhete e o homem alto de cabelos grisalhos não se proibiu de dizer:"Se não encontra o seu bilhete é por que se calhar não tivesse que fazer esta viagem ". Odiei-o nesse instante. As minhas incertezas seriam assim tão transparentes? Passou-me tudo pela cabeça.
Nunca pensei encontrar-te. Era um acampamento como todos os outros. Os melhores amigos, churrasco e sacos-cama. Eu estava sentado na tenda de guitarra no colo, e tu vinhas de tomar banho. Não nos conhecíamos. Mas vinhas a cantar a música que eu estava a tocar. Lembras-te aonde ías? "...faz desses rumos os caminhos teus...". A tua voz bateu perfeita no acorde em que eu ía. Nenhum de nós conseguia acreditar no que estava a acontecer. Continuaste a cantar e eu comecei a fazer a segunda voz. Ainda tinhamos mais 2 versos e 2 refrões em conjunto. E as férias grandes ainda estavam a começar.
Nem acredito que agora estou a fazer a viagem inversa. Vou para ficar. Embalado pelo compasso dos carris que evocam esses acordes de Verão. Não largo o bilhete da mão e estendo-o ao mesmo homem alto de cabelos grisalhos. "- Aqui tem o meu bilhete. Este não é como o outro. Este é só de ida".

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